Homenagens ao Papa Emérito Bento XVI

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A morte do Papa Emérito Bento XVI, na manhã do dia 31 de dezembro, mexeu com toda a Igreja. Desde a confirmação de seu falecimento pela Santa Sé, começaram a surgir ao redor do mundo manifestações de admiração e reconhecimento pelo papa alemão que conduziu a Igreja de Cristo por oito anos.

Nos últimos dias, dois estudiosos da Arquidiocese de Juiz de Fora publicaram artigos em homenagem a Bento XVI: enquanto o texto do Padre Elílio de Faria Matos Júnior foi divulgado no Jornal Tribuna de Minas, o escritor Luís Eugênio Sanábio e Souza teve seu trabalho veiculado no site do Vatican News. Confira, abaixo, os dois textos na íntegra.

O Arcebispo Metropolitano, Dom Gil Antônio Moreira, também escreveu um artigo em homenagem ao Papa Emérito. Clique aqui e confira.

O legado de Bento XVI

*Por Padre Elílio de Faria Matos Júnior

Bento XVI teve como grande orientação para o pensamento e para a vida o primado de Deus, tema realçado de modo particular pela espiritualidade da escola daquele que certamente lhe inspirou o nome: Bento de Núrsia.

Procurar o primado de Deus num mundo que, sob diversos aspectos, quer-se pós-cristão e pós-teísta é um grande desafio. Realçar as raízes que nossa vida tem no Eterno para uma mentalidade que vive submersa no tempo é uma empreitada difícil. Chamar a atenção para as coisas da alma e para o encontro íntimo com o Verbo de Deus num tempo em que só se quer o espetáculo e a exibição é colocar-se num caminho de incompreensão.

Sem negar – muito ao contrário! – que a Igreja tem uma missão temporal, social e até política (sem que ela mesma deva tomar o governo político), Bento XVI enfatizou a sede de infinito que caracteriza a alma humana e procurou apontar para a Fonte de Água Viva que é Deus. Nesse sentido, esforçou-se por defender a fé da Igreja diante do que considerava obnubilar o seu caráter transcendente. Defendeu a sacralidade da liturgia diante de tendências consideradas redutivistas. Quando o establishment realçava a relatividade das coisas humanas a ponto de, em muitos casos, abrir caminho para o relativismo e o niilismo, Bento XVI insistia na marca do Definitivo que está impressa no núcleo do coração humano. Se somos finitos e se nosso conhecimento é relativo, nem tudo, porém, deve desaguar nas falsas equiparações ou no vazio. Nossa finitude é atravessada pela positividade do Infinito de Deus, de um Deus tão próximo que quis mostrar-se visível aos nossos olhos carnais e fazer história conosco como verdadeiro homem, em Jesus de Nazaré.

Ratzinger não foi muito bem compreendido por muitos, porque, de certa maneira, nadava contra a correnteza. Mas foi justamente assim que nos deu sua parcela de contribuição e deixou sua grande marca na Igreja e no mundo. Nossas questões temporais têm muito a ganhar se abrirmos, de par em par, nossa alma para o Eterno. Não é preciso estar de acordo com todas as posições de Ratzinger para reconhecer a importância e a clarividência do núcleo do seu pensamento.

Eis o legado de Bento XVI, pastor e teólogo: o anúncio vivo, com todos os recursos argumentativos da razão e da fé de que, sem Deus, sem o Infinito, a vida humana fica estreita. Com Deus, ao contrário, tudo muda; sem tirar-nos nada do que faz a vida humanamente boa, Ele nos dá muito mais: abre-nos o horizonte de sua Vida, Luz eterna e Amor indestrutível.

 O admirável Papa Bento XVI

*Por Luís Eugênio Sanábio e Souza – escritor

“Eu creio para compreender e compreendo para melhor crer”. Esta máxima de Santo Agostinho revela com exatidão a trajetória de vida do manso e inteligente Joseph Aloisius Ratzinger.

Na minha juventude, eu amei o Papa São João Paulo II e observava o quanto ele admirava e defendia o então cardeal Ratzinger. Este testemunho do papa polonês a favor de Ratzinger não era irrelevante. São João Paulo II conhecia a inabalável fé e as qualidades intelectuais daquele que mais tarde seria seu sucessor na Cátedra de Pedro.

Ao longo de sua vida e sobretudo ao exercer o cargo de Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Ratzinger sempre quis lembrar que a fé da Igreja precede, gera, sustenta e alimenta a fé dos católicos e, consequentemente, o que deve crer o fiel é aquilo que a Igreja crê. As intervenções do Magistério da Igreja servem para garantir a unidade da Igreja na verdade de Cristo. Ajudam a “permanecer na verdade”, frente ao caráter arbitrário das opiniões mutáveis, e são a expressão da obediência à Palavra de Deus. Assim, Ratzinger considerava que mesmo quando pode parecer que limitem a liberdade dos teólogos, as intervenções do Magistério da Igreja “instauram, por meio da fidelidade à fé que foi transmitida, uma liberdade mais profunda, que não pode provir senão da unidade na verdade” (Instrução Donum veritatis nº 35).

As posteriores posições heterodoxas de certos teólogos da libertação, inclusive no campo moral, mostraram claramente o quanto o cardeal Ratzinger foi sábio ao disciplinar estes teólogos, mostrando que a teologia não pode ser manipulada para fins ideológicos, políticos ou pessoais.  Ratzinger ensinou que os enunciados da fé não resultam de uma investigação puramente individual e de um livre exame da Palavra de Deus, mas constituem uma herança eclesial. Se alguém se separa dos Pastores que velam por manter viva a tradição apostólica, é a ligação com Cristo que se encontra irreparavelmente comprometida.

Um dos maiores e notáveis trabalhos do cardeal Ratzinger foi a sua decisiva contribuição na elaboração do Catecismo da Igreja Católica, iniciado em 1986 e definitivamente promulgado por São João Paulo II em 1997. Com mais de 2800 parágrafos, este Catecismo é uma exposição dos conteúdos essenciais e fundamentais da doutrina católica tanto sobre a fé como sobre a moral, à luz do conjunto da tradição da Igreja. Ao combater o relativismo moral e religioso, Ratzinger explicou ao mundo sobre a unicidade e universalidade salvífica de Jesus Cristo e da Igreja. Este foi o tema da admirável “Declaração Dominus Iesus”, publicada no ano 2000.

Sabemos que a providência divina e não os conchavos políticos levou Ratzinger ao papado e ele exerceu seu ministério petrino de maneira serena e corajosa num período marcado por problemas morais dentro e fora da Igreja. Entre os principais documentos que publicou no exercício das funções de Sumo Pontífice, estão as encíclicas “Deus Caritas Est”, “Spe salvi” e “Caritas in Veritate”. Consciente de suas fragilidades físicas, o Papa Bento XVI renunciou em conformidade com a lei canônica (cânon 332 §2) e não movido por supostas pressões internas ou externas.

“Senhor, eu te amo!” Estas foram as últimas palavras pronunciadas pelo admirável Papa Bento XVI, algumas horas antes de morrer. De Joseph Aloisius Ratzinger fica um exemplo de perfeita ortodoxia, de retidão, de fé, de desprendimento e de caridade. Em uma palavra podemos todos dizer que ele foi um grande homem!

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