Adeus ao Marcos Paulo

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Ao saber do falecimento de Lázaro, Jesus chorou. Recebendo notícia de sua doença, já previra a morte de seu amigo e dissera aos discípulos: Lázaro dorme! (Jo. 11,11). Diante de seu túmulo, rezou ao Pai e o ressuscitou dentre os mortos com seu divino poder e ao ouvir a voz do Mestre, aquele que havia morrido saiu da escuridão da morte e se apresentou vivo. Muitos que presenciaram o fato passaram a crer em Cristo.

Para quem crê em Deus a morte perde sua força, embora a dor de ver partir alguém tão querido resulte em lágrimas e puros lamentos. Não há nada de contradição nisso. São expressões do amor que rege os que vivem como irmãos, ou por laços sanguíneos, ou por força da pura amizade, ou ainda pela ternura que une os que experimentam a vivência da mesma fé, na mesma comunidade religiosa.

Às três horas de 26 de fevereiro último, recebi o comunicado telefônico da notícia que, humanamente, nenhum de nós quereria escutar. Falecera o jovem seminarista Marcos Paulo Rodrigues Pires, do primeiro ano de Teologia de nosso Seminário Arquidiocesano Santo Antônio de Juiz de Fora. Completara 21 anos no domingo anterior e os celebrou já no altar do sacrifício, sobre um leito da CTI da Santa Casa, acometido de AVC. Estive com ele naquele dia e foram os últimos momentos que pude conviver com este filho querido e o fizemos, ele e eu, na luz benfazeja da oração. Rezou comigo com voz forte, olhar brilhante, expressão de muita fé, as orações do Pai Nosso e da Ave Maria. Depois ficou repetindo ternamente: Livrai-nos do mal. Amém! Livrai-nos do mal. Amém! Recebeu de minhas mãos a bênção e permaneceu em seu sacrifício, causando-nos muita dor convivida com todos os padres e seminaristas de nosso Seminário Arquidiocesano.

De 5 a 9 de fevereiro, fez o seu retiro espiritual juntamente com todos os demais colegas estudantes, retiro este que preguei com muita devoção. Porém, no penúltimo dia, já não pôde participar integralmente, por sentir-se mal. Todos suspeitavam de dengue. Mas era já prenúncio de sua hora. Os exames acusaram aneurisma e AVC. Depois de oito dias debatendo-se sob cuidados dos profissionais da saúde, o Médico dos médicos o chamou e ele partiu serenamente, como uma vela que vai se apagando pouco a pouco diante do altar terreno, para se reacender exuberante no altar da eternidade.

Seus pais, Everaldo e Nilcéia, e seus irmãos, família de Deus muito presente na vida da Igreja, atuantes na Paróquia de São Joaquim e Santana, na cidade de Santos Dumont, me contaram coisas bonitas de sua vida, que só depois do doloroso acontecimento vamos começando a entender. Marcos Paulo teve uma infância com muitos problemas de saúde. Os pais tiveram que lhe dedicar atenção diuturna, sempre apreensivos pela iminência de um desfecho funesto. Foi quando pai e mãe o entregaram amorosamente a Nossa Senhora, depositando nas mãos dela a vida e o futuro do filhinho. Os sintomas desapareceram e eles viram o menino crescer amoroso, inteligente, super religioso e determinado a consagrar sua vida a Deus pelo sacerdócio ministerial.

Desde pequeno, frequentemente punha seus irmãos e seus pais a rezar com ele, fazia como se estivesse celebrando a missa, e até promovia, com ritos religiosos que sua mente infantil criava, o sepultamento de animais domésticos quando morriam. Sua avó, a quem devotava especial afeição, a tudo acompanhava.

Na adolescência, matriculou-se no conservatório de música, onde desenvolveu seus dotes artísticos. Iniciou seus estudos no Seminário Menor, cursou brilhantemente a Filosofia, formando-se no final de 2015, quando foi escolhido pelos colegas para orador de sua turma. Nada mais apresentava de problemas com a saúde. Porém, ao chegar fevereiro, fez sua páscoa definitiva, indo agora realizar seu sonho, sua vocação, de maneira mais perfeita junto ao único, sumo e eterno Sacerdote no santuário do céu. Convictos, os piedosos pais, cheios de fé, o confiaram a Deus serenamente, contemplando-o nos braços de Maria, a quem o entregaram na infância.

Na Eucaristia, nós, com sua família, com a comunidade do Seminário e da sua Paróquia, o entregamos nas mãos do Pai, esperando o dia de nosso encontro final, onde, com Lázaro, Marta e Maria, vamos nos alegrar com a vitória da vida sobre a morte, com os coros dos anjos e santos celebrarmos a vida que nunca acabará, na eterna liturgia da Ressurreição, pois cremos que Cristo é a ressurreição e a vida; quem nele crê não morre jamais!

Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

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