Cristo, nos extremos de seu amor, não se contentou em dar sua vida na cruz pelos seres humanos, mas desejou mais. Quis perpetuar-se no Pão e no Vinho eucarísticos, a fim de que seus discípulos tivessem a certeza de que permaneceria com eles cotidianamente até a consumação dos séculos, como afirma São Mateus ao encerrar seu evangelho: “Eis que estarei convosco, todos os dias até o fim dos tempos” (Mt 28,20).
No evangelho de São João, Jesus afirma: “Eu sou o Pão vivo que desceu do céu; quem come deste pão viverá para sempre. O Pão que eu darei é a minha carne entregue para a vida do mundo” (Jo 6,51).
Pelo Sacramento da Eucaristia, Jesus permanece unido misticamente com os que nele creem e que procuram sinceramente obedecer aos seus mandamentos, recebendo-O no sacramento da Eucaristia, prontos a dar frutos em benefício do Reino de Deus. Estes fiéis seguidores do Mestre de Nazaré, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, estão sempre atentos ao seu amoroso convite: “Permanecei em mim e eu permanecerei em vós. Aquele que permanece em mim e eu nele, esse dá muito fruto” (Jo 15,4-5).
No corrente ano de 2016, a Solenidade de Corpus Christi tem um especial sentido. Estamos celebrando o Ano Santo Extraordinário da Misericórdia, instituído pelo Papa Francisco, procurando escutar, a cada dia, renovadamente, o convite de Jesus: “Misericordes sicut Pater” (Sede misericordiosos como o Pai) (Lc 6,36).
O Sacramento da Eucaristia é a realização mais elevada da misericórdia divina, pois Deus entrega seu próprio Filho para morrer na cruz, a fim de salvar os que nele creem. Ressuscita-O ao terceiro dia e O oferece à sua grei, diariamente, na Celebração da Ceia e Sacrifício, a que hoje chamamos Missa, a Páscoa permanente dos que O amam. Alimenta-a com comida salutar, no caminho que a leva ao banquete feliz e definitivo da eternidade.
Tudo está centrado no augusto mistério da Páscoa. Dele tudo emana e para ele tudo se dirige na liturgia e na vida cristã. No âmago da misericórdia se esconde a generosa e total oblatividade do Pai que continua oferecendo, a cada dia, seu Filho para alimento e força a cada pessoa que a ele se abre. Da parte do ser humano, a resposta virá através da fé que se concretiza na aceitação amorosa de sua palavra e na prática fiel de suas obras. São João narra em seu evangelho que, depois de Jesus ter pronunciado longo discurso sobre o mistério da eucaristia e da Palavra, tendo afirmado: Eu sou o pão da vida; vossos pais comeram o maná do deserto, mas morreram. Aqui está o pão que desce do céu, para que não morra quem dele comer (Jo 6,49-50), os judeus discutiam entre si: “como pode ele dar a sua carne a comer?”. Mesmo entre os discípulos de Cristo, alguns se recusaram a aceitar sua palavra, julgando-a dura demais, e o abandonaram. Porém, o Senhor em nada mudou de sua pregação e, voltando-se para os doze apóstolos, disse: “Vós também não quereis ir embora?” Foi quando São Pedro fez sua adesão de fé: “A quem iremos, Senhor, só Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que Tu és o Santo de Deus!” (Jo 6,67-69). Tais expressões de Pedro se tornaram a profissão de fé de toda a Igreja que a vem proclamando no correr da sua história bimilenar.
O Mistério da Eucaristia é algo que vem das realidades sobrenaturais, não terrenas, pela meditação da Igreja de Cristo, oferecido aos pobres mortais pela misericórdia infinita de Deus. Crer em Cristo é antes de tudo um dom do alto que deve ser recebido.
O Papa Francisco afirma: “Deus não deixa de nos surpreender. Ele se faz próximo. Ele se dá na Eucaristia, o verdadeiro alimento que sustenta a nossa vida.” Na festa de Corpus Christi (Corpo de Cristo) ou Corpus Domino (Corpo do Senhor) ou ainda Corpus Dei (Corpo de Deus), os que creem renovam sua fé no Mistério da Eucaristia e expressam sensível, amorosa e publicamente sua adoração a Jesus, misticamente presente nas espécies consagradas do Pão e do Vinho, o gesto supremo da misericórdia divina que não conhece limites.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora