Profundidade da fé, autenticidade das atitudes e o Reino que virá

Hoje celebramos em todo o mundo a Solenidade de Cristo Rei do Universo e o encerramento do Ano Litúrgico de 2024, durante o qual lemos todo o evangelho de São Marcos. Celebramos também o dia dos leigos e leigas que são a parte mais numerosa da Igreja. Em nossa Arquidiocese de Juiz de Fora, estamos, felizes, encerrando o III Congresso Eucarístico, no contexto do Ano Eucarístico que estamos percorrendo desde o dia primeiro de fevereiro, quando comemoramos os cem anos de fundação de nossa Diocese, mais tarde elevada a arquidiocese. O terceiro Congresso Eucarístico, precedido pelo primeiro em 1939 e o segundo em 1950, tem sido para nós uma experiência extraordinária de espiritualidade vivamente celebrada não só na sede juiz-forana, mas em todas as 12 foranias e 92 paróquias espalhadas pela zona da Mata Mineira e parte do Sul de Minas. A Semana Teológica de nosso Seminário Santo Antônio ocupou-se da parte acadêmica, com conferências de grande valor teológico, filosófico e pastoral, atingindo presbíteros, diáconos, seminaristas, e numerosos leigos e leigas. Contamos com bela participação de nossos bispos oriundos no nosso clero: Dom Walmor Oliveira de Azevedo, Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues, Dom João Justino de Medeiros e Dom Roberto José da Silva. Também no enriqueceram com suas conferências os teólogos biblistas, Dom José Otácio e Prof. Eduardo Antônio Faria (Pastor Presbiteriano convertido à fé Católica); o nosso liturgista, Pe. Leonardo Pinheiro; e o pastoralista, Pe. Humberto Robson de Carvalho, da Arquidiocese de São Paulo; com nossa historiadora e jornalista, Profª Rita Couto; com o leigo e missionário evangelizador das crianças, Sr. Otávio Piva, da Arquidiocese de São Paulo. Além destes, recebemos Pe. Fabio Vieira, da Diocese de Corumbá, que nos trouxe a relíquia do Beato Carlo Acutis, este jovem influenciador da internet marcado pelo extraordinário amor à Eucaristia, a Nossa Senhora e à Igreja, e que será canonizado pelo Papa Francisco no próximo dia 27 de abril de 2025.

Da solenidade

            A Solenidade de Cristo Rei do Universo é ocasião em que a mãe Igreja nos chama a acolher o senhorio de Jesus e espalhar os sinais do seu Reino que não é deste mundo. A festa de Cristo Rei foi criada por Pio XI (1922-1939) em 1925, num contexto mundial de grandes conflitos políticos, marcados pelo autoritarismo, pela violência, pela disputa de poder. O comunismo, na Rússia, havia se imposto por meios das armas e da violência, havia assinado a família dos Czares e imposto totalitariamente seu regime pela força. O nazismo, na Alemanha, e o fascismo, na Itália, causavam efeitos iguais de desrespeito às liberdades humanas. Estes três movimentos causavam duas terríveis guerras mundiais, provocando a morte de pessoas das mais variadas idades e condições sociais. Nada valeram os apelos dos Papas, demonstrando, na expressão de Bento XV, que “com a guerra tudo se perde, com a paz tudo se ganha”. O povo dominado pelo medo e pela opressão da violência ansiava por uma solução a fim de viver em paz. Eram os reinos deste mundo que perdiam, cada vez mais, a confiança dos povos. Haveria de existir um líder que não andasse por estes caminhos, marcados pelo ódio e pelas mentiras, pela opressão e massificação de direita e de esquerda.

A Igreja, então, cumprindo sua missão de anunciar a paz, a justiça e o amor, ressalta, mais uma vez, a pessoa e a mensagem do maior dos líderes da humanidade, Jesus Cristo, Deus e Homem verdadeiro, que nos apresenta um Reino que não é deste mundo, porquanto, vivendo na terra, tem conclusão definitiva no céu; acontece no tempo, mas se realiza totalmente na eternidade. O Rei dos reis e Senhor dos Senhores é aquele único que merece total confiança e relativiza todas as correntes políticas e ideológicas deste mundo. Propõe caminhos de santidade, de fraternidade, de paz gerados por um profundo e autêntico amor a Deus e ao próximo.

Tudo isso tem fundamento no diálogo de Jesus com Pilatos, apresentado no evangelho de hoje, narrado por São João Evangelista. “Tu és rei”, pergunta Pilatos. “Tu o dizes”, responde Jesus, “mas meu Reino não é deste mundo; se fosse deste mundo, meus guardas me defenderiam…Eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade escuta a minha voz” (cf Jo 18, 33-37).

Nosso Congresso

             Em Juiz de Fora, nesta semana que termina, transformada em III Congresso Eucarístico, tivemos oportunidade de aprofundar nossas relações pessoais e comunitárias com este Rei diferente, único e verdadeiro através de estudos profundos, de reuniões fraternas, de celebrações marcadas pela profundidade da fé, pela autenticidade das atitudes, pela santidade da liturgia, pela disposição da partilha do pão com os vulneráveis e empobrecidos, pela união com Deus e com o próximo.

            O III Congresso veio nos reforçar na convicção de que neste Reino há um banquete preparado pelo Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, pelo Bom Pastor que “prepara a minha mesa bem à frente do inimigo”, que passando entre nós nos serve o pão de cada dia, o pão dos anjos transformado em pão dos homens, o novo maná que não é como aquele dos nossos antigos pais no deserto, pois eles comeram e morreram, mas “quem come deste pão tem a vida eterna em si”. Este Rei que embora tenha vindo, vivido, pregado, ensinado, curado os doentes, libertado os pobres, não é deste mundo, mas transcende os limites desta vida e leva para o banquete da eternidade aqueles que o seguem, sabendo que ele é caminho, verdade e vida.

E como será este reino?

Neste III Congresso, recordamos que no seu Reino não há lugar para violência, nem para narrativas enganosas e revanchistas, nem mentiras, nem disputas de poder, pois ele continua a dizer como disse a Pedro: “Embainha a tua espada” (Mt 26,52). No seu Reino, não há lugar para incredulidade, pois, como diz Daniel na primeira leitura de hoje: “seu poder é um poder eterno que não lhe será tirado, e seu reino, um reino que se dissolverá” (Dan 7, 14). O Apocalipse nos reanima a cada momento que o lemos. Ele nos fortalece afirmando que “Jesus Cristo é a testemunha fiel, o primeiro a ressuscitar dentre os mortos, o soberano dos reis da terra” (Ap 1, 5). O Banquete eucarístico nos recorda que no seu reino não há lugar para o desânimo, como foi revelado a Elias “Levanta-te e come, pois te resta ainda um longo caminho a caminhar” (cf I Reis, 19, 1-19). A Sagrada Eucaristia, nos alimenta, nos alegra, nos une, nos faz crer na sinodalidade que nos leva a caminhar juntos, felizes, corajosos, vencendo as rixas, as desconfianças, as desavenças, a inveja e tantas outras coisas que querem nos desunir. A Eucaristia bem celebrada e bem recebida, nos recorda que foi Jesus mesmo que disse: “que todos seja um, para que o mundo creia” (cf Jo 17, 21). A presença real de Jesus na Eucaristia nos garante que ele está conosco, pois disse” Eis que estarei convosco, todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28,20); e que nós estamos com ele, porque também nos disse: “permanecei em mim e eu permanecerei em vós” (Jo 15, 4) e ainda: “Tomai e comei, isto é meu corpo; tomai e bebei, este é o cálice de meu sangue… quem come o meu pão e bebe de meu cálice, tem a vida eterna. ” (cf I Cor 11, 26).

 Jesus é nossa vida, nossa esperança, nossa confiança, nosso Amém.

Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
(Homilia para a solenidade de Cristo Rei do Universo,
Encerramento do III Congresso Eucarístico de Juiz de Fora)

 

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